domingo, 26 de maio de 2013

JOSÉ LUÍS MAGRO:Taxa fiscal em vigor é bastante equilibrada

Publicado em: Dom, Mai 2 Consultor e auditor chama atenção ao facto de o imposto industrial em Angola ser de 35 por cento, margem bastante aceitável comparada aos 32 por cento, que se cobra em países como Moçambique. Comparando a nossa taxa normal do imposto indus­trial que é de 35 por cento com outros países de África de expressão portu­guesa, como Moçambique e Cabo Verde, as suas taxas genéricas são de 32 e 30 por cento, respecti­vamente. Esta comparação mos­tra que a nossa taxa não é assim tão elevada e com a entrada em vigor do novo imposto industrial a taxa prevista vai ser de 30 por cento, pelo que ficaremos ao nível da taxa cabo-verdiana. Qual é a avaliação que faz sobre o sistema de tributação adoptado em Angola? Foram dados passos importan­tes com as alterações dos seguin­tes impostos: selo, aplicação de capitais, consumo e a lei do mecenato. Porém, o imposto industrial, que a nível de Orçamento Geral do Estado está incluído no imposto sobre o rendimento das pes­soas colectivas, deveria ter sido alterado conjuntamente com os impostos acima, tendo em con­sideração que é aquele que mais contribui para a receita tributá­ria do país. Por exemplo, em ter­mos de percentagem, em função dos dados apurados no Ministé­rio das Finanças, por via do Orça­mento Geral do Estado, em termos de impostos, em 2011, represen­tou 36, 8 por cento, em 2012, 38, 1 por cento e este ano pode che­gar aos 29, 5 por cento. Quanto ao imposto sobre rendimento de pes­soas colectivas chegou a 21,5, 18,6 e 15, 9 por cento, em 2011, 2012 e 2013, respectivamente. Por outro lado, tendo em consi­deração que existe uma classe empresarial que não tem um grande domínio na área fiscal e também de habilitações literárias, dever-se-ia ter em linha de conta esta realidade, pelo que a redac­ção dos articulados dos impostos referidos no primeiro parágrafo, concretamente imposto de con­sumo e selo, deveria ter sido mais clara e precisa. De que forma a política fiscal pode acelerar o crescimento e o desenvol­vimento económico de Angola? Se se analisar o quadro do ponto anterior, verifica-se que tal não está a acontecer com a agravante de que a receita tributária conti­nua a ter uma grande dependên­cia do petróleo e esta por sua vez também decaiu no último triénio: O imposto sobre rendimento de pessoas colectivas contraiu-se de 21,5 em 2011 para 15, 9 em 2013. Em 2012, chegou a 18,6 por cento, enquanto o imposto sobre ren­dimento (petróleo) saiu de 17, 8 para 10, 5 por cento em 2013. No ano passado, ultrapassou os dez, atingindo 12, 8 por cento. Neste contexto, deve-se anali­sar casuisticamente a realidade acima e verificar quais as melho­res políticas fiscais, no sentido de se inverter esta situação. Até que ponto a elaboração de estudo sobre benefícios fiscais pode ajudar a impulsionar cada vez mais o sector das finanças no país? É necessário medir-se devida­mente os prós e os contras dos benefícios fiscais para que não se caia no erro da Lei nº 17/03 – Lei sobre os Incentivos Fis­cais e Aduaneiros ao Investi­mento, que está suspensa, mas os investidores que requere­ram em devido tempo conti­nuam a ter os correspondentes benefícios. Foi criada a Lei nº30/11 – Micro e Pequenas e Médias Empresas, mas não se sabe, pelo menos publi­camente, qual o impacto que tem tido a nível dos benefícios em sede de imposto industrial e o impacto económico que tem havido desde que surgiu esta lei. Por que razão os entendidos na maté­ria consideram que os impostos taxa­dos em Angola são bastante onerosos, em comparação com os outros paí­ses, seja da região, seja de outra parte do mundo? Comparando a nossa taxa nor­mal do imposto industrial que é de 35 por cento com outros paí­ses de África de expressão por­tuguesa, como Moçambique e Cabo Verde, as suas taxas gené­ricas são de 32 e 30 por cento, respectivamente. Esta compa­ração mostra que a nossa taxa não é assim tão elevada e com a entrada em vigor do novo imposto industrial a taxa pre­vista vai ser de 30 por cento, pelo que ficaremos ao nível da taxa cabo-verdiana. A formação de quadros é fundamen­tal numa economia em crescimento. Que estratégias devem ser adopta­das para que os técnicos angolanos sejam bem capacitados? A formação é primordial, mas deve existir sempre a preocupação de contextualizar as formações, no sentido de os formandos pode­rem aplicar na prática os conhe­cimentos adquiridos. Que contributo a Magroconsulting tem proporcionado para o apoio à gestão de empresas? Os sócios da Magroconsulting, autores do manual de contabili­dade angolano, que é uma refe­rência no ensino da contabilidade no país, têm como preocupação formar os recursos humanos dos seus clientes nos próprios locais de trabalho. Temos conseguido implementar métodos de traba­lho que têm permitido aos nos­sos clientes ter uma informação financeira e económica atem­pada e eficaz, o que é fruto de muita persistência e capacidade de persuasão. Ao longo deste tempo, sentimos que o nosso trabalho é reconhe­cido, o que nos deixa orgulho­sos e motivados para prosseguir com a filosofia de trabalho que adoptámos. Que rumo está a tomar a área da con­tabilidade em Angola? A comissão instaladora dos con­tabilistas e peritos contabilistas criada pela Lei -232 de 11/10/2010 poderá ser um óptimo veículo para o bom funcionamento da conta­bilidade em Angola. Será que o país já tem contabilistas capazes tecnicamente sem que se faça recurso a profissionais estran­geiros? Não temos dados suficientes baseados em estudos para afir­mar categoricamente se temos ou não contabilistas tecnica­mente capazes. Que aspectos primordiais devem constar na elaboração de um plano de negócio? Montar um negócio é algo sério, pelo que deve ser devidamente pensado e só depois se deve avan­çar. Os planos de negócio, pese embora serem elaborados por consultores, têm de ser os seus promotores a defendê-los, nomea­damente, junto da banca e não ao contrário, ou seja, o consultor é que vai defender o negócio. O investimento tem de ser muito bem pensado. Outro aspecto assaz importante é o parceiro do negó­cio que tem de ser sempre bem escolhido. No nosso mercado, ainda se assiste a uma certa desorganização financeira em algumas empresas, quer esta­tais, quer privadas. Qual é o método que deve ser seguido para que uma empresa esteja devidamente orga­nizada? Nas palestras que temos feito em concreto sobre “a importân­cia da contabilidade nas organi­zações” referimos que os líderes das empresas devem solicitar, porque não exigir, que os seus serviços de contabilidade e finan­ças forneçam quinzenalmente informação financeira credível e trimestralmente informação económica. Por outro lado, as empresas têm de começar a trabalhar com orça­mentos, quer a nível de investi­mentos, quer a nível operacional e os desvios devem ser devida­mente analisados. Também muitas empresas não pos­suem estudos estratégicos devida­mente detalhados. Isso não contribui para a ineficiência dos serviços? Muitas das nossas empresas fun­cionam com uma estrutura tipo sol, em que tudo gravita à volta dos seus donos. São eles que con­tratam pessoal, negoceiam com a banca, fazem os aprovisiona­mentos… Esta forma de actua­ção está ultrapassada a nível de negócios, pelo que os empresá­rios têm de aprender a delegar e a responsabilizar os seus recur­sos humanos. De que forma a sua empresa realiza consultoria fiscal? A consultoria fiscal deve visar dois aspectos: primeiro, a aplica­ção das leis vigentes e, segundo, a formalidade dos documentos. Assim, são estes os nossos guias para o desenvolvimento do nosso trabalho. Pela consultoria que efectua tem encontrado vários erros, fraudes e outras anomalias nas empresas? Há um pressuposto que considera­mos errado que é este: “o auditor tem sempre de encontrar erros, fraudes…”. O auditor e o consultor devem preocupar-se fundamen­talmente com o sistema de con­trolo interno, que quanto mais deficiente for maior é a proba­bilidade de cometerem se erros e fraudes. Que opinião tem sobre o funciona­mento da Comissão de Mercado de Capitais? Somos consultores e formadores da Comissão de Mercado de Capi­tais (CMC) e dizemos que há um grande esforço dos seus dirigen­tes em pôr os mercados primário e secundário a funcionarem no curto e médio prazos. Com isso, acha que estão criadas as condições técnicas e materiais para o arranque da bolsa de valo­res de Angola? O funcionamento da bolsa de valores depende muito da dinâmica da Ordem dos Con­tabilistas e Peritos Contabi­listas, porque os auditores da bolsa têm de ter à partida uma credenciação da ordem e tam­bém da CMC. Por outro lado, se é pretensão ter uma bolsa internacional, há necessidade de instituir-se um sistema de normalização contabilística internacional (Cabo Verde e Moçambique já o têm) à luz do International Accounting Standard of Board (IASB), onde terá voz activa a Ordem dos Contabilistas e Peri­tos Contabilistas. Afalta de auditoria eficaz é um dos “handicaps” para o funcionamento da bolsa de valores. Que soluções devem ser encontradas para a mate­rialização deste projecto? O que foi referido no ponto ante­rior tem aqui aplicação. No cenário económico actual, o mer­cado consumidor está cada vez mais exigente. Oque deve ser feito para a busca de aumento de produtivi­dade e redução de custos na gestão dos negócios? As empresas públicas e privadas têm de evoluir nos seus sistemas, quer de trabalho (racionalização), quer de produção, pese embora a falta de energia eléctrica ser por vezes um entrave à evolução deste último. Ao analisar os relatórios de ges­tão de muitas empresas, no que respeita ao balanço social, verifi­ca-se que o absentismo é grande e repete-se de exercício econó­mico para exercício económico, sem que nos próprios relatórios, sejam referidas as medidas cor­rectivas para combater este fla­gelo, visto ser indubitavelmente um entrave à produção e produ­tividade das empresas. Outras empresas têm pessoal a mais e tendo em consideração o que se ensina em economia “o subemprego é pior que o desem­prego” é outro factor negativo para a melhoria da produtivi­dade dessas empresas. Por que razão a gestão estratégica de custos é considerada ferramenta fundamental para a tomada de deci­sões e alcance dos resultados alme­jados pela organização? Os custos devem ser pensados de uma forma contínua, nomeada­mente, os fixos, que em situações de crise económica ou arrefeci­mento do negócio, poderão criar sufocos financeiros às empresas. Para o efeito, os mapas de explora­ção, cuja análise deve ser mensal podem ser uma ferramenta para as empresas saberem como estão a ser geridos os seus custos, em especial os fornecimentos e ser­viços de terceiros. A política de investimentos, em especial máquinas e equipamen­tos, tem de ser bem delineada, tendo em conta vários factores que existem em Angola, como a falta de energia eléctrica e assis­tência técnica, no sentido de evitar paralisações e gastos desneces­sários com a manutenção dessas máquinas e equipamentos. Qual é a diferença que existe entre a contabilidade societária e a contabi­lidade gerencial? Na nossa vida de investigação da contabilidade, temos visto muitos tipos de contabilidade que julga­mos ser para melhor vender uma imagem ou uma formação. Exis­tem os ramos da contabilidade financeira, de custos (ou analítica), agrícola (ou agrária), ambiente (ou ambiental) e outras específi­cas para sectores de actividade como a banca e seguros. Consubstanciamos o que refe­rimos tendo como suporte a normalização contabilística inter­nacional, em que o IASB (Interna­tional Accounting Standard) criou as suas normas internacionais que regularizam todas as conta­bilidades acima referidas. Muitas empresas ainda têm proble­mas na contabilidade gerencial. Como reduzir os custos sem afectar a pro­dutividade? Vincenzo Masi definiu con­tabilidade como “a ciência do património”. Ora, o patrimó­nio tem de ser defendido para que possa ter continuidade e a redução de custos tem também a ver com outro ramo do saber que é a gestão. Neste contexto, implica tal, como já referimos, uma plani­ficação da empresa assente em orçamentos credíveis, em que os desvios sejam periodicamente analisados. Há empresas que têm serviços de orçamento e de análise financeira, mas a sua contabilidade está atrasada meses e meses. Ora, os orça­mentos elaborados deixam de ter qualquer relevância. História de um vencedor O auditor e oconsultor devem preocupar-se fundamentalmente com o sistema de controlo interno. As pessoas têm o seu carácter singular, seja extrovertido, seja introvertido. Um desses traços, naturalmente, caracteriza o nosso entrevistado, mas tende mais para a frontalidade de ideias que, amiúde, são debitadas publicamente, quer em grupo restrito – onde são transmitidos os conhecimentos –, quer através da imprensa, particularmente nos espaços de abordagem de assuntos de índole económica, como é caso do programa “Vector”, emitido por uma rádio comercial da capital, sob chancela da Associação Industrial Angolana (AIA). Percurso José Luís Faria Magro, de 63 anos, natural do Lobito, província de Benguela, não é uma pessoa desconhecida. É consultor, auditor e formador em Angola e noutros países, onde é solicitado regularmente para administrar aulas. Em Angola, muitas pessoas formadas, absorvendo matérias viradas para a profissão do ramo da economia, já passaram por ele, através das aulas que administrou, em vários centros de formação com realce para o Instituto de Formação Bancária de Angola (IFBA). Licenciou-se em contabilidade na Universidade Lusíada de Portugal, onde também fez o pós-graduado em finanças empresariais. É, igualmente, mestre em contabilidade e auditoria pela Universidade de Minho. Antigo funcionário do Banco Comercial de Angola – actual BPC – Banco de Poupança e Crédito–, é autor conjuntamente com a sua esposa, Adelaide Magro, do Manual de Contabilidade Angolano (já na segunda edição), obra lançada há quatro anos. O livro, conforme acentuou na entrevista, é já uma referência no ensino da contabilidade em Angola. José Magro tem vários trabalhos apresentados sobre contabilidade e fiscalidade em Angola, Portugal, Brasil e Moçambique. Pessoal José Luís Magro é formador há 20 anos. Tem um filho. O seu “hobby” é trabalhar e viajar. O seu sonho é ver Angola independente, no que diz respeito ao conhecimento. MATEUS CAVUMBO (Jornal de Economia & Finanças)

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