Publicado em 01/01/2019 10:33 e atualizado em 01/01/2019 17:25
SÃO PAULO (Reuters) - Jair Bolsonaro toma posse nesta terça-feira sob um esquema de segurança sem precedentes para este tipo de evento e com a promessa de um governo que quebre paradigmas que vão desde o modelo de negociação com o Congresso até a forma de comunicação com a sociedade.
Vitorioso na campanha presidencial mais polarizada da história, Bolsonaro (PSL) também terá de enfrentar um rombo fiscal que já dura cinco anos e um cenário econômico que conta com 12 milhões de desempregados e a necessidade de reformas como a da Previdência.
Bolsonaro, com 63 anos, tomará posse às 15h, em cerimônia no Congresso Nacional ao lado do general Hamilton Mourão, que será seu vice-presidente. Depois irá ao Palácio do Planalto onde receberá a faixa presidencial do atual presidente Michel Temer (PMDB).
Em meio ao forte esquema de segurança que cerca a posse, o tradicional desfile em carro aberto dos presidentes recém-empossados pode não ocorrer e uma decisão sobre o assunto será anunciada apenas nesta terça-feira.
A expectativa é que entre 250 mil e 500 mil pessoas acompanhem a posse de Bolsonaro. O GSI não quis revelar o efetivo de segurança que será usado no evento.
Além de simpatizantes e lideranças políticas brasileiras, também acompanharão a posse do novo presidente autoridades internacionais, como o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo, representantes de dois países com que Bolsonaro deverá buscar relações estreitas.
MUDANÇAS E DESAFIOS
No período de transição de governo, iniciado pouco depois de seu triunfo eleitoral em 28 de outubro, Bolsonaro manteve suas promessas de campanha, entre elas a de mudar a forma de negociação do Executivo com o Legislativo e de não buscar indicações partidárias para compor o primeiro escalão do governo.
Em vez disso, nomeou auxiliares alinhados à sua ideologia mais à direita e apontou que suas tratativas com o Parlamento se dariam por meio de conversas com bancadas temáticas -- nomeou a coordenadora da Frente Parlamentar da Agropecuária, Tereza Cristina, para chefiar o Ministério da Agricultura, por exemplo.
Indicou também vários militares para postos-chaves do governo, casos dos generais Augusto Heleno e Carlos Alberto Santos Cruz, que estarão ao lado do novo presidente no Palácio do Planalto, o primeiro como chefe do GSI e o segundo à frente da Secretaria de Governo.
“Não é que não vai ter conversa, o modelo que vigora ainda, de ministério por votos, não deu certo. Mergulhou o Brasil em ineficiência e na corrupção. Os parlamentares mesmo não querem mais isso. Alguns foram levados para o olho do furacão no vácuo, não queriam estar lá. E a grande parte deles, que temos conversado, é que o modelo que estamos adotando não é que pode dar certo, tem que dar certo", disse o futuro presidente no final de novembro.
A efetividade dessa estratégia, no entanto, tem sido alvo de ceticismo por parte de lideranças partidárias acostumadas com os bastidores da política.
Bolsonaro deve inaugurar também um novo modelo de comunicação de presidente da República. Após vencer a eleição impulsionado por uma bem-sucedida estratégia nas redes sociais, o novo presidente fez de sua conta no Twitter o principal canal para anúncios de nomes do primeiro escalão.
O modelo, parecido com o adotado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de quem Bolsonaro é declarado admirador, deverá permanecer com o capitão da reserva instalado no gabinete presidencial.
A mudança radical na política externa, que deverá ser uma das marcas do novo governo, poderá ser testada já no final do primeiro mês de mandato, caso Bolsonaro compareça --como tem sinalizado que fará-- ao Fórum Econômico Mundial, na cidade suíça de Davos.
Após a sua estreia no palco internacional, o novo presidente se ausentará do cargo para realizar a cirurgia de retirada da bolsa de colostomia, colocada após a facada de setembro que perfurou seu intestino e o obrigou a passar por duas cirurgias de emergência.
Primeiro militar a assumir a Presidência desde o fim da ditadura em 1985, Bolsonaro será temporariamente substituído nesses dois períodos --a possível viagem a Davos e a cirurgia-- pelo seu vice, o general da reserva Hamilton Mourão, que será assim o primeiro general a ocupar o Palácio do Planalto desde o fim do regime militar.
A missão de Bolsonaro, editorial do ESTADÃO
Jair Bolsonaro toma posse com a missão de promover as reformas das quais o Brasil depende para evitar o colapso das contas nacionais
Jair Bolsonaro tomará posse hoje como presidente da República com a missão de promover as reformas das quais o Brasil depende para evitar o colapso das contas nacionais. Não se trata de uma escolha, tampouco de um projeto deste ou daquele partido, e sim de um imperativo nacional. É isso ou presidir um país ingovernável.
É certo que Bolsonaro foi eleito por uma fatia expressiva dos brasileiros que viram nele não o reformista de que o País tanto precisa, mas o homem que se comprometeu a varrer para o passado, quem sabe para o esquecimento, o petismo e seu terrível legado. O presidente cometerá um grave erro, no entanto, se limitar sua agenda e suas energias a essa faxina política e moral.
Pois não se pode ignorar que muitos eleitores de Bolsonaro esperam dele, antes de tudo, uma ação vigorosa e imediata contra o que enxergam como intolerável influência da esquerda na educação, nas artes e nos costumes. Na hipótese de ser levada a sério pelo presidente, essa visão tenderá a drenar forças políticas de um governo que deveria concentrar-se no essencial – e nem de longe o essencial, hoje, é fiscalizar o comportamento de professores, enquanto o sistema educacional continua em ruínas.
A encruzilhada em que o País se encontra não permite distrações desse tipo, úteis somente para quem pretende desviar a atenção dos reais e múltiplos problemas que devem ser enfrentados sem delongas. Se quiser realmente transformar o Brasil “em uma grande, livre e próspera nação”, como prometeu em seu discurso da vitória, Bolsonaro terá de usar seu imenso capital político para convencer os brasileiros, a começar de seus eleitores, de que o mais importante neste momento é concentrar esforços para reformar a Previdência e racionalizar drasticamente os gastos públicos, medidas que normalmente são impopulares. Sem isso, o País não atrairá os investimentos que se traduzem em empregos.
Os desafios são abundantes. Nos quatro anos do mandato que hoje se inicia, as despesas primárias (que não incluem o pagamento de juros) terão de ser reduzidas em R$ 148,8 bilhões, ou 0,5% do PIB, por ano. Um rombo desse tamanho não será eliminado sem grandes sacrifícios, que vão muito além do enxugamento de Ministérios e da venda de estatais. Será preciso cortar na carne.
É urgente discutir a sério o engessamento do Orçamento, que impede o uso racional das receitas, pois grande parte delas tem destinação definida pela Constituição, e não pela realidade. É previsível que qualquer proposta que vise a desvincular receitas, cortando gastos onde eles não são necessários, seja recebida com a já tradicional zanga das corporações, até aqui muito satisfeitas com o loteamento do Orçamento entre elas; logo, o governo terá de estar pronto para enfrentar a vigorosa tradição patrimonialista que tanto atravanca o País.
Ademais, o governo que está começando decerto sabe que não há espaço para novos aumentos salariais de servidores públicos, tema que gera profundo desgaste para qualquer presidente. Também é notório que a política de correção do salário mínimo, hoje bastante generosa, terá de ser revista, o que provavelmente terá repercussão negativa entre os milhões de trabalhadores que estão nessa faixa de remuneração, sem falar dos aposentados cujo benefício é reajustado por esse indicador.
Além disso, será preciso modificar substancialmente a política de subsídios e incentivos fiscais, que, a título de estimular determinados setores da economia, acabou transferindo renda dos mais pobres para os mais ricos e não resultou em aumento significativo nem da produtividade nem da geração de empregos.
E isso é só o começo. Há um profundo déficit de segurança pública, saúde, educação, saneamento básico e infraestrutura que está há anos à espera de quem se disponha a enfrentá-lo para valer, sem demagogia.
Sempre que começa um novo governo, a esperança de que isso finalmente venha a acontecer se renova. Só não é possível imaginar que tantos problemas se resolvam por mágica ou por ato de vontade. É preciso muito trabalho e, acima de tudo, a consciência de que é a solidez dos fundamentos da economia que assenta todo o edifício de um bom governo. Com Jair Bolsonaro vão as esperanças de todos os brasileiros.
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Fonte: Reuters/Estadão
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