quarta-feira, 1 de junho de 2016

Mosca dos estábulos continua azucrinando rebanhos



Um problema relativamente novo está tirando o sono dos pecuaristas





Trata-se da mosca dos estábulos, que causa estresse entre os animais, perda de apetite, emagrecimento e até aborto entre as matrizes. Hoje com focos espalhados por usinas de cana, os insetos se tornaram um incômodo à medida em que foram deixando de acontecer as queimadas dos canaviais. A justificativa está na manutenção do ambiente propício à sua multiplicação: a palhada sobre a qual é despejada a vinhaça. "Para se desenvolver, tudo de que a mosca precisa é de locais com temperaturas mais elevadas, umidade e matéria orgânica", afirma Paulo Henrique Cançado, da Embrapa Gado de Corte. Preocupante, o impasse é de responsabilidade das usinas, mas também dos pecuaristas.
"A lei obriga a usina a aplicar a vinhaça sobre a palha, e a proíbe de fazer queimadas. O pecuarista, por sua vez, está lidando com um efeito colateral disso. Mas eles não devem brigar. Devem agir em conjunto para minimizar o problema", frisa Cançado. Recentemente, uma reunião com diversas entidades envolvidas, além de produtores, foi convocada em Araçatuba, SP, para debater o tema e apresentar estratégias de controle da mosca dos estábulos. Segundo o pesquisador da Embrapa, para avançar no assunto algumas recomendações precisam ser seguidas à risca.
No caso das usinas:
Como foi dito anteriormente, a proliferação da mosca depende de altas temperaturas, umidade e presença de matéria orgânica para acontecer. "E se na temperatura a gente não influencia, nos outros fatores podemos mexer sim", diz Cançado.
Falando de umidade, o usineiro pode cuidar, por exemplo, da qualidade de aplicação da vinhaça. "Diferente do mosquito da dengue, que se multiplica na água, em poças, a mosca dos estábulos não sobrevive em uma situação assim. Mas onde tem poça, a mosca vai se multiplicar na periferia".
Para facilitar sua secagem, a palha pode ser incorporada ao solo em um processo denominado escarificação. Em linhas gerais, o procedimento consiste em romper a camada superficial do solo, de 15 cm a 30 cm, com o uso de implementos de haste, e movimentá-lo sem tirar dali grande parte dos resíduos vegetais, o que evita a erosão. Também pode ser feito o recolhimento de parte da palha para geração de energia.
Outra recomendação é que nas usinas onde há moenda e pátios de compostagem de torta de filtro seja feito um revolvimento do material orgânico pelo menos duas vezes por semana. Resíduo sólido da filtragem do caldo da cana-de-açúcar, a torta de filtro é - ao lado da palha com vinhaça ou vinhoto - um dos principais focos de multiplicação da mosca. "Agora, não podemos esquecer que nem todas as usinas vão ter equipamento suficiente e gente treinada para fazer esse revolvimento na frequência certa e da maneira correta - sem deixar, inclusive, aquele restinho de torta lá perto do solo, porque ali a mosca também consegue se desenvolver", diz.
Segundo o pesquisador, o melhor manejo tem que ser encontrado por cada usina dentro de suas possibilidades, considerando também características da variedade de cana e tipo de solo do canavial.
Para tornar o controle viável, outra medida essencial é o monitoramento. "Assim como os agentes de saúde circulam nas cidades para combater os focos de Aedes aegypti, no campo, a usina deve ficar de olho não na sua área total, mas nos locais onde aplica a vinhaça. Ver se ali encontra ovos e larvas da mosca". O controle direcionado também ajuda a poupar recursos. Por fim, vale eliminar vazamentos de água nas imediações da indústria.
No caso dos pecuaristas:
Do lado de lá da cerca, as medidas estão focadas principalmente na higiene do curral e na eliminação do acúmulo de matéria orgânica. Entram na lista de prioridades: fazer o recolhimento de restos de ração, folhas, silagem ou fezes que possam estar dentro ou nas imediações das instalações. E dar um destino para esse material. "Não adianta tirar de dentro do curral e fazer um montinho no canto", afirma Cançado. Segundo ele, se o pecuarista precisar fazer um montinho, então que o cubra pelo período de duas a três semanas, vede bem e - depois que a matéria orgânica fermentar - faça uso como adubo. "Pode usar na pastagem, na horta da fazenda ou até vender como adubo orgânico".
Além disso, é preciso cuidar da umidade: consertar a boia do bebedouro que está vazando, a torneira que está pingando. "O pecuarista, fazendo isso, cumpriu o papel dele. Porque quanto menos mosca sair da propriedade e for botar ovo no canavial, melhor", completa Cançado.
Alternativas para o controle
Químicos: De acordo com Cançado, hoje os químicos não são a melhor opção para fazer o combate à mosca. No caso dos animais, brincos e pour-on não apresentaram eficiência. Já os sprays têm surtido efeito por tempo limitado, de dois a três dias, tendo baixo custo-benefício, segundo o pesquisador. Para casos críticos, em que se corre o risco de perder o animal, Cançado indica o uso desde que consultado um médico-veterinário para checar que produto usar e em que dose, ainda sob pena de ter que descartar a produção - por contaminação da carne ou do leite.
Biológicos: Sobre o uso de produtos biológicos para controle da mosca, ele diz que muitas das alternativas existentes ainda estão passando por análise laboratorial.
Na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, fungos foram testados como forma de controle das larvas, e apesar de terem demonstrado bons resultados em laboratório, falta ser realizada a validação em campo.
A própria Embrapa pesquisa ácaros que parasitam a larva da mosca e está na fase de encontrar parcerias com instituições privadas para produzi-los em maior escala e viabilizar o lançamento de um produto no mercado. O projeto teve apoio da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundect) e do Cnpq.
Juntamente com a Universidade Católica Dom Bosco, a Embrapa Gado de Corte também trabalha em uma linha de pesquisa com possível controle fazendo uso de veneno de serpente.
Alteração da norma para aplicação de vinhaça: Durante o encontro em Araçatuba, Antônio Queiróz, membro da diretoria da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), falou sobre a norma para aplicação de mais de 400 milhões de m³ de vinhaça nos canaviais paulistas. De acordo com ele, o texto do regramento foi revisto em 2015, mas diante do problema com a mosca, se houver necessidade, não há nada que impeça que sejam feitas alterações.
Para Cançado, a questão da norma é complexa e não se pode achar que essa é a solução para resolver o problema de imediato. "A norma foi feita baseando-se no que seria o melhor para preservar o solo, lençóis freáticos e produzir cana na região. Hoje não se tem informação técnica suficiente para decidir o que seria melhor ou pior em relação à mosca; sem esquecer ainda desses outros fatores", afirma. E alerta: "Diminuir o volume por hectare [de aplicação da vinhaça], significa aumentar o número de hectares onde hoje se aplica o subproduto. Então, pode ser que uma medida assim leve a mosca para mais longe", completa. Por enquanto, o assunto permanece em discussão.


Data de Publicação: 01/06/2016 às 09:15hs
Fonte: Portal DBO

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