sexta-feira, 30 de março de 2018

Cresce o número de produtores que adotam o reúso na agricultura

Sistema é fundamental para preservação de recursos hídricos, por isso cresce a cada ano

Correio Brazilense
30 Mar 2018 - 06:30
Cresce o número de produtores que adotam o reúso na agricultura
Foto: Breno Fortes/CB/D.A Press
Os cientistas já bateram o martelo. Ou a humanidade aprende a usar a água potável de forma correta e racional ou ficamos sem ela e colocamos a nossa própria existência em risco. O Brasil tem um papel de extrema importância na preservação desse recurso. Os sistemas de irrigação adotados no país permitem o uso eficiente dos recursos hídricos e o aumento da produção de alimentos para cada hectare de lavoura plantada, sem a expansão de áreas. É por isso que cresce, a cada ano, o número de produtores e empresas que adotam técnicas de reúso desse líquido na agricultura e na produção de alimentos.

O Brasil se destaca pela variedade e produtividade, mas também pelo modo de produção, dinâmico e inovador, que permite a plantação anual de até três safras em um mesmo terreno. A área agrícola do país representa 7,8% do território nacional, cerca de 66 milhões de hectares. Apenas 9% das lavouras brasileiras são irrigadas. A área irrigada no país totalizou, no ano passado, 6 milhões de hectares aproximadamente.

O número é pequeno, mas tem potencial para aumentar em cinco vezes, ou seja, 30 milhões de hectares, de acordo com a analista de geoprocessamento da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Lucíola Alves Magalhães. “Ainda precisamos de mais infraestrutura elétrica e de distribuição de água em várias regiões do Brasil, além da capacitação tecnológica dos agricultores e acesso a essas tecnologias. Os agricultores e o poder público já perceberam que, sem irrigação, perderemos em termos de produção”, explica.

A água é imprescindível para a agricultura, mas nem toda área agrícola é irrigada. Em muitas propriedades é praticada a agricultura de sequeiro, que conta apenas com água da chuva para produção. Aos poucos, o país evolui para a utilização do sistema de irrigação na produção agrícola, saindo da fase dos sulcos, que consumia muita água, para a irrigação localizada e por gotejamento.

Produtividade

Os pivôs de irrigação propiciam um menor consumo de água por hectare onde o sistema está instalado. Já os sistemas de gotejamento fazem uma espécie de gerenciamento dos recursos hídricos — as gotas caem próximas às raízes, evitando, assim, a evaporação da água. “Ao aumentarmos a área irrigada, conseguiremos aumentar ainda mais a produtividade, ou seja, produzir mais alimento para cada hectare de lavoura plantada, sem necessariamente expandir a área”, assinala a pesquisadora da Embrapa.

A irrigação controlada repercute economicamente em diversas etapas da produção agrícola. O sistema resulta em economia de água e de consumo de energia, boa umidade e máxima produtividade da lavoura. Propicia, também, um microclima mais favorável para a não ocorrência de pragas. “Isso é outro fator de economia. Se a irrigação é feita corretamente, podem ser eliminados gastos adicionais, já que diminui a pressão sobre a demanda de água e reduz os riscos de surgimentos de pragas, o que significa que o uso de defensivos agrícolas pode ser menor”, analisa Gertjan Beekman, coordenador da área de Recursos Naturais, Gestão Ambiental e Adaptação às Mudanças Climáticas do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).

Beekman coordenou o Econormas, da União Europeia, programa destinado a implementar ações de intervenção física para o controle e recuperarão de áreas degradadas que estivessem submetidas a processos de desertificação nos quatro países do Mercosul.

Já o IICA é um organismo internacional especializado em agricultura e bem-estar rural, sendo vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA). A entidade apoia os 34 países-membros em demandas específicas relacionadas à agricultura.

O uso eficiente de água na agricultura e as técnicas de reúso são cada vez mais importantes para a produção de alimentos, em função das mudanças climáticas, segundo o coordenador do ICCA. “Não é só ter o recurso hídrico, mas usá-lo de forma inteligente, aproveitando o ciclo de chuvas e as ferramentas agrometeorológicas para planejamento do setor agropecuário, que está cada vez mais dinâmico, inovador e requer precisão e confiabilidade”, avalia Beekman.

O que diz o Código Florestal

O Código Florestal brasileiro preconiza que os agricultores destinem parte das suas terras para a preservação da vegetação. Os percentuais variam a depender do bioma. Na Amazônia, por exemplo, 80% da área do imóvel é destinada à preservação.

No Cerrado, cai para 20%. Os dados consolidados do  Sistema Nacional do Cadastro Ambiental Rural (Sicar) mostram que os agricultores brasileiros destinam 177 milhões de hectares para a preservação da vegetação. Isso representa 48% da área dos imóveis, em média, e 20,5% de todo o território nacional. Essas áreas preservadas são interconectadas com a rede de drenagem existente no Brasil. Ou seja, ao preservar as margens dos rios, os agricultores contribuem para a preservação dos recursos hídricos.

Um dos motivos de o Brasil ter se tornado uma das maiores potências mundiais da agricultura foi a implantação de novas tecnologias no campo. A experiência brasileira em técnicas de cultivo extrapolaram as fronteiras nacionais. Hoje, o país que se tornou o segundo maior exportador de alimentos do mundo também exporta conhecimento. Esse foi o principal motivo para a visita ao Brasil de ministros e vice-ministros da Agricultura de 11 países do Caribe.

“O Brasil tem sido capaz de quebrar o ciclo da agricultura global por meio de inovação, investimentos em pesquisa, políticas públicas e legislação. É um importante exemplo para nós”, enfatiza Barton Clarke, diretor-geral do Instituto de Pesquisa Agrícola e Desenvolvimento do Caribe (Cardi, na sigla em inglês). Os países da região sofrem com os efeitos do clima e têm desafios com relação à segurança alimentar.

 
Pesquisas e soluções nacionais para o desenvolvimento da agricultura, como a biofortificação de alimentos, adubação orgânica e compostagem, chamaram a atenção da delegação. “Temos muito a aprender com o Brasil”, resume Alexis Jeffers, ministro da Agricultura de São Cristóvão e Névis, o menor país das Américas, que tem uma população de 55 mil habitantes, aproximadamente.

Um dos problemas que aquele país enfrenta é relacionado ao êxodo de jovens do campo, desmotivados pelo modo de produção incipiente e pequena produção agrícola. O governo local trabalha para manter os jovens no campo, diminuir o êxodo rural e melhorar a sustentabilidade nos modos de produção. “Queremos atrair a juventude para que se envolva mais no campo, e essas tecnologias certamente chamam mais atenção dos jovens, pois envolvem técnicas mais modernas”, conta Alexis Jeffers.

A presidente da Comunidade do Caribe (Caricom, na sigla em inglês), Desiree Field-Ridley, explica que a agricultura é tema prioritário para os países do bloco. A atividade agropecuária, no entanto, não vem crescendo como o bloco espera. “A agricultura é um de nossos setores-chave. Estamos procurando pelo tipo de auxílio que nos permita dar o suporte necessário à agricultura, um setor que não tem crescido do modo como precisa crescer e do modo que esperamos que cresça”, diz Field-Ridley.

Pesquisas

A Embrapa foi a primeira parada da delegação de ministros e vice-ministros de agricultura de países caribenhos. Na unidade de Hortaliças, localizada no Núcleo Rural Vargem da Benção, no Gama, o grupo conheceu as pesquisas com adubação orgânica e compostagem. Os países do caribe enfrentam dificuldades na área de nutrição de plantas, já que não têm amplo acesso aos fertilizantes minerais, geralmente importados.

O grupo conheceu, também, tecnologias desenvolvidas para a agricultura tropical com foco no produtor familiar, estruturas de cultivo protegido e uma câmara de simulação climática, tecnologias que viabilizam o cultivo e a pesquisa com hortaliças, mesmo em condições ambientais adversas; e um campo de batata-doce, alimento muito consumido em alguns países caribenhos, cultura com custo de produção baixo que apresenta boa tolerância à seca e fácil adaptação ao clima

Na Central de Abastecimento do Distrito Federal (Ceasa), houve apresentação de boas práticas de produção da agricultura familiar e urbana, da alimentação saudável, do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), de acesso à água, inclusão produtiva, voluntariado e banco de alimentos. “O Brasil fez vários avanços no desenvolvimento da agricultura.

A maioria dos produtores nos países do Caribe são pequenos agricultores, então pensamos que é uma oportunidade para colaborarmos e aprendermos com algumas das boas práticas que existem no Brasil”, analisa Beverly Best, representante da Organização dos Estados do Caribe Oriental (OECS, na sigla em inglês).

"O Brasil tem sido capaz de quebrar o ciclo da agricultura global por meio de inovação, investimentos em pesquisa, políticas públicas e legislação. É um importante exemplo para nós”
Barton Clarke, diretor-geral do Instituto de Pesquisa Agrícola e Desenvolvimento do Caribe

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