segunda-feira, 2 de junho de 2014
Exótico, cedro australiano dribla praga e ganha espaço
Exótico, cedro australiano dribla praga e ganha espaço
Em maio de 2006, o empresário mineiro Ricardo Steinmetz Vilela foi ao aeroporto internacional Tancredo Neves, em Confins, Minas Gerais, apanhar um pacote enviado a ele da Austrália
Era uma embalagem plástica e cheia de pequenos envelopes contendo mais de 100 mil sementes de cedro australiano.
Vilela tinha importado o lote do Australian Tree Seed Centre, órgão da agência australiana de pesquisas científicas da Austrália (Csiro). Seu plano era desenvolver mudas de qualidade da espécie e então formar florestas dessa que é uma árvore cuja madeira tem sua qualidade bastante reconhecida nos mercados da Europa, EUA e Japão.
Passados oito anos, o empresário tem hoje um tesouro em sua fazenda na cidade de Campo Belo, no sul de Minas. Um viveiro com 60 mil matrizes de cedro australiano de onde saíram mudas clonadas que ele começou a vender em outubro. Estudiosos de duas universidades federais de Lavras e de Viçosa, ambas em Minas, dizem não ter notícia em nenhum outro lugar do mundo de um projeto desse tipo e com essa escala envolvendo cedro australiano.
Vilela diz já ter vendido, desde outubro, 500 mil dessas mudas clonadas. Parte delas para produtores rurais e parte para projetos maiores, entre os quais um de Rubens Ermínio de Moraes - filho de Antonio Ermínio, do grupo Votorantim -, e outro de um projeto que tem como sócio José Roberto Marinho, das Organizações Globo. O próprio Vilela, ao lado de parceiros, está formando suas florestas de cedro australiano. Uma delas de 70 hectares; outra está começando a ser plantada numa área de 1.500 hectares, que segundo ele será o maior plantio da espécie no Brasil.
Cultivar cedro australiano é um investimento com potencial promissor, mas ainda com riscos. Sua madeira é muito semelhante à do cedro brasileiro - também chamado de cedro-rosa, cedrinho entre outros nomes. A árvore brasileira foi muito usada e valorizada para a fabricação de móveis até que começou a escassear. As fábricas do Sudeste passaram a comprar madeiras de cedro nativo de Rondônia - árvores monumentais, seculares com mais de 30 metros. Desmatada Rondônia, a busca passou a ficar mais difícil, conta Antonio Lelis Pinheiro, professor da Universidade Federal de Viçosa e doutor em silvicultura.
O cedro australiano tem o mesmo tom avermelhado, é leve e fácil de ser cortado tanto quanto o primo brasileiro. E tem uma vantagem imbatível: ser resistente a uma praga (uma mariposa de nome científico Hypsipyla grandella) que é uma forte ameaça aos plantios de cedro brasileiro. A ocorrência da Hypsipyla grandella torna impraticável o cultivo comercial de mogno e também é um grande problema para o cedro, de acordo com a Embrapa. Ainda não há formas de manejo que evitem seu ataque. As larvas do inseto escavam "galerias" e destroem o broto em mudas e em árvores novas.
No quesito preço: o metro cúbico da espécie pode chegar a R$ 2.000. O metro cúbico do eucalipto, outra opção de plantio nesse segmento, com sorte chega a R$ 500 ou R$ 600. A previsão que Vilela faz a seus clientes é de um investimento total de R$ 20 mil por hectare ao longo de 10 anos e um retorno de cerca de R$ 150 mil.
Sobre o eucalipto, a planta australiana tem outra vantagem: ecológica. "A fauna e a flora são menos impactadas do que em outras monoculturas, como a do eucalipto, que tem uma substância que inibe outras espécies", diz Edson Ampelio Pozza, professor de Epidemiologia e manejo de doenças de plantas da UFLA.
Ricardo Vilela e sua irmã começaram a investir em florestas no início dos anos 2000. Escolheram plantar eucalipto e para ter plantas saudáveis e que produzissem bem, montaram um viveiro. A empresa que criaram é a Bela Vista Florestal, que fica na fazenda de mesmo nome em Campo Belo. Plantaram 7 mil hectares de eucalipto em fazendas nos municípios mineiros de Campo Belo, Cristais, João Pinheiro e Jequitaí. Vendiam para grandes consumidores industriais como Fíbria, Votorantim e siderúrgicas diversas, diz o empresário.
"Um dia um empresário me disse que queria plantar algo que tivesse mais valor do que o eucalipto", lembra Ricardo Vilela, na casa que serve de escritório e que fica em um ponto da fazenda cercado de árvores e ao lado dos viveiros de eucaliptos e cedro.
Vilela bateu na porta da Universidade Federal de Viçosa, em Minas, e na da Embrapa. Na primeira, lhe sugeriram cedro australiano e na segunda, mogno africano. "O problema é que as sementes disponíveis eram ruins e, portanto, havia o risco de as plantas não irem para frente." A decisão então foi investir em mudas clonais. Clonar plantas é algo relativamente trivial: retira-se um ramo selecionado de uma planta, deixa-se que ele enraíze e dele nascerá uma planta com as mesmas características da matriz.
E onde havia matrizes de mogno africano e cedro australiano saudáveis e com características desejáveis? Novamente, os irmãos decidiram montar um viveiro. Vilela diz que não encontrou nenhum órgão em países africanos de onde pudesse importar lotes de sementes de mogno africano com procedência atestada. Mas encontrou na Austrália um órgão mais ou menos equivalente à Embrapa, o Csiro. De lá, importou sementes em 2006 - com vasto prontuário de informações sobre as árvores de onde saíram - e depois em 2012.
Com apoio de professores e alunos da Universidade Federal de Lavras (UFLA), o projeto começou com a produção de 30 mil mudas a partir de sementes de 100 árvores de Austrália. Das 30 mil, a equipe do empresário e os acadêmicos selecionaram as 12 mil melhores; dessas, clonaram as melhores 1.500; selecionaram então as 100 melhores, depois as 40 até chegarem aos seis melhores cultivares em termos de produtividade, troncos mais retos, ganho de diâmetro e resistência a pragas. E foi a partir dessas seis que começou a reprodução em escala comercial, diz Vilela. "Já investimos R$ 3 milhões em pesquisas até agora", diz Vilela.
Ele se gaba de que as pesquisas do projeto já geraram três doutorados e seis mestrados na UFLA. "Não havia praticamente nada no Brasil de pesquisa sobre cedro australiano. O que tinha, e era pouco, era sobre cedro brasileiro", diz o professor da universidade Antonio Eduardo Furtini Neto.
Os resultados práticos o empresário mostra num plantio na fazenda em Campo Belo, onde colocou lado a lado cedros de clones e cedros de sementes plantados na mesma época. Os clones são mais altos, têm troncos mais grossos e retos. Segundo ele, o incremento médio anual de cedros australianos plantados a partir de sementes é de 12,6 metros cúbicos por hectare; no caso dos plantados a partir de clones, de 25 metros cúbicos a 37 metros cúbicos. A planta se dá bem em terrenos férteis, não pedregoso e com bom índice de chuvas. E com 10 anos já tem tamanho para corte.
O cedro australiano foi introduzido no continente americano nos anos 1970 por pesquisadores que queriam verificar se a espécie da Austrália era resistente à mariposa grandella que ocorre da Flórida à Argentina, conta Antonio Lelis Pinheiro. Descobriram que era. Na Austrália, ele é vulnerável à Hypsipyla Robusta. "Hoje, o cedro australiano é plantado em vários países da América Central, principalmente na Costa Rica, no Havaí e também em países africanos", diz. No Brasil, Vilela se destaca, acrescenta ele. Se a praga pode vir a quebrar a resistência do cedro australiano? Difícil prever, diz Pinheiro, que lembra que em de 40 anos na América isso nunca ocorreu.
Essa não é a primeira introdução da planta no Brasil. Nos anos 70, a Aracruz Celulose espalhou mudas do cedro australiano no Espírito Santo. O projeto tinha como objetivo produzir madeira para laminados e compensados, mas acabou não prosperando. As mudas que sobraram foram doadas para o órgão ambiental do Estado, que as distribuiu entre pequenos e médios agricultores. A produção capixaba, porém, não é grande o suficiente.
E aí está um desafio, diz Pinheiro: convencer a indústria moveleira do Brasil sobre a viabilidade e o valor do cedro australiano. Vilela afirma que já está vendendo madeira serrada entre R$ 1.500 e R$ 2 mil o metro cúbico para os primeiros compradores. Há outro desafio: como o cedro australiano é uma espécie exótica, ainda faltam mais pesquisas sobre adubação, espaçamentos, podas, cultivos da planta.
Por isso há quem diga que investir em uma espécie sobre a qual ainda se conhece pouco é loucura, afirma o professor Antonio Lelis Pinheiro. A essa afirmação, ele responde: "Há cerca de 60 anos, alguém começou a cultivar no país eucalipto para fins comerciais e hoje o Brasil tem a tecnologia de cultivo e de usos dessa planta. Se alguém não começasse a fazer a isso com o cedro australiano, nunca se saberia mais sobre ele."
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Data de Publicação: 02/06/2014 às 12:00hs
Fonte: Canal do Produtor
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