quinta-feira, 25 de julho de 2013
25/07/2013 08:00
25/07/2013 08:00
Manutenção da diversidade agrícola é tema de pesquisa
Professora da Unesp discute perspectivas atuais de conservação
Assessoria de Comunicação e Imprensa UNESP
A manutenção da diversidade agrícola pelos próprios agricultores em suas situações de vida é o tema da livre-docência em Ecologia Humana e Etnobotânica de Maria Christina de Mello Amorozo, professora do departamento de Ecologia do Instituto de Biociências (IB) da Unesp, Câmpus de Rio Claro.
O texto 'Sistemas Agrícolas de Pequena Escala e a Manutenção da Agrobiodiversidade: uma revisão e contribuições' não se restringe às pesquisas realizadas pela autora e seus alunos, mas traz uma revisão bibliográfica relativa a alguns aspectos dos sistemas agrícolas de pequena escala que são relevantes para a conservação da agrobiodiversidade. São ainda apresentados estudos de caso em agrobiodiversidade e discutidas as perspectivas atuais de conservação da agrobiodiversidade on farm.
Para a professora, a biodiversidade agrícola se conserva on farm na medida em que ela é útil de alguma forma para os agricultores, considerando aqui 'utilidade' em um sentido amplo. Em todas as situações estudadas, encontramos, entre os agricultores de pequena escala, a manutenção de um certo nível de agrobiodiversidade.
As comunidades tradicionais que praticam agricultura de subsistência são, de acordo com Maria Christina, as que mantêm, em geral, a maior riqueza de espécies e variedades e o conhecimento mais aprofundado sobre suas características e requerimentos ecológicos, confirmando o que a literatura aponta.
Entre agricultores familiares em bairros rurais, assentamentos e áreas urbanas e periurbanas, a riqueza encontrada foi em geral menor, embora, em algumas situações, ainda bastante expressiva e o conhecimento etnobotânico também foi, em geral, menor. Também nestas situações, os indivíduos que se sobressaíram pela maior riqueza conservada e conhecimento etnobotânico, tinham tido experiência de vida em situações onde agricultura de subsistência ainda era praticada, pelo menos parcialmente.
As dificuldades vividas no campo, segundo a professora do IB, e as aparentes vantagens da vida urbana, moderna, são algumas das razões pelas quais a mão-de-obra agrícola não está sendo completamente reposta, à medida que a população ativa vem envelhecendo. Em muitas situações, mesmo nas comunidades tradicionais, há um crescimento do número de agricultores em tempo parcial, em detrimento do número de agricultores em tempo integral. Da mesma forma, o número de jovens rurais que se engaja em atividades não-agrícolas vem aumentando.
O espaço no campo, para Maria Christina, também tem sofrido modificações. O solo agrícola está sendo posto para outros usos: industrial, urbano ? principalmente em regiões mais populosas; monoculturas em grande escala; estabelecimento de Unidades de Conservação de Proteção Integral e equipamentos de lazer. As áreas de comunidades tradicionais e de bairros rurais diminuem ou se descaracterizam neste processo, caso não haja ações no sentido de protegê-las, e a emigração consequentemente aumenta.
De acordo com a livre-docência, a conservação on farm dos recursos fitogenéticos está intimamente relacionada à continuidade dos sistemas agrícolas onde eles se encontram. Como já foi assinalado, a agrobiodiversidade é utilizada como uma estratégia de minimização dos riscos, e portanto tem alto valor de sobrevivência para agricultores que contam apenas com os recursos locais e que são, na maior parte dos casos, muito pobres (do ponto de vista econômico). É legítimo e muito necessário que estas populações queiram melhorar de vida. É possível que estas melhoras ocorram sem necessariamente serem acompanhadas da perda da identidade e de valores próprios?
Todas estas iniciativas são importantes, seguindo o raciocínio da professora da Unesp, pela promoção do reconhecimento das prerrogativas das sociedades tradicionais, marcando para a sociedade como um todo a sua importância e fomentando respeito e valorização de outros modos de vida e formas de ver o mundo. Porém, há ainda um longo caminho a percorrer para que elas se tornem efetivas no sentido de melhorar a qualidade de vida do agricultor. São as próprias comunidades que têm que estabelecer as suas reivindicações e os caminhos que querem seguir; os agentes da sociedade externa (pesquisadores, extensionistas, técnicos) podem contribuir com este processo, avaliando e construindo junto com elas as diversas possibilidades.
Quanto ao agricultor familiar, segundo Maria Christina, também tem havido avanços em relação às políticas públicas de incentivo, com programas como o Programa Nacional da Agricultura Familiar (PRONAF), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), entre outros. Estes programas, no entanto, não são flexíveis o suficiente para se adequar às diversas realidades do pequeno agricultor de norte a sul do país, obrigando-o algumas vezes a alterar seu portfolio de atividades usuais para poder receber o financiamento. E, pior ainda, não colocam em pauta a agrobiodiversidade.
“Pelo contrário, muitas vezes exigem que o agricultor forneça produtos padronizados e não condizentes com a sua situação de produção. Isto tem sido constatado no que diz respeito ao fornecimento para a Merenda Escolar. A lista de produtos é preparada por nutricionistas, que muitas vezes não têm informação sobre os itens produzidos no município, que acabam sendo sub-aproveitados ou rejeitados”, afirma a pesquisadora.
Segundo Maria Christina, a modernização da pequena agricultura familiar e as políticas públicas que a incentivam valorizam, em geral, a produtividade. Agricultores familiares que adotam este modelo tendem a plantar variedades comerciais mais produtivas e mais uniformes, com maior aceitação no mercado, em áreas maiores; eles podem continuar a plantar as variedades locais, mas em áreas menores, e às vezes, apenas em quintais. Seria interessante propor políticas de remuneração para aqueles que mantêm uma certa quantidade de área plantada com variedades locais, à semelhança dos projetos de pagamento por serviços ambientais.
“Medidas de âmbito mais abrangente, como o ordenamento do uso do solo e zoneamento agroecológico, se efetivamente praticadas, também serviriam para proteger áreas de pequena agricultura, sobretudo em terras valorizadas, limitando sua invasão pelo crescimento das cidades e parques industriais”, afirma a professora do IB.
“As espécies vegetais e animais domesticadas não têm o apelo de mídia e o glamour que a vida selvagem tem para o cidadão comum. No entanto, mais de 90% da nossa alimentação são provenientes delas e diversidade é questão de segurança e soberania alimentar, sendo, portanto, fundamental. Deveriam ser envidados esforços para a mobilização da sociedade em geral para a questão da perda da agrobiodiversidade, de sua importância e a promoção de sua valorização, a começar pela educação dos consumidores urbanos, acostumados a exigir produtos uniformes e de padrão cosmético muitas vezes incompatível com as variedades locais. Valorizar e dar visibilidade aos agricultores de pequena escala, que, ao longo do tempo, vêm criando e manejando a agrodiversidade que chegou até nossos dias deveria fazer parte da agenda social mais ampla”, conclui a professora do IB da Unesp de Rio Claro.
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