segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Cultivo do trigo beneficia sistemas de produção agrícola do Brasil Central



Publicado em 30/09/2019 14:39 e atualizado em 30/09/2019 15:16


A valorização do trigo na última safra e as vantagens oferecidas pela cultura nos sistemas de produção no Cerrado da região central do País têm despertado o interesse de produtores da região, sobretudo os que rotacionam culturas sob irrigação. Com o aperfeiçoamento do manejo, produtores têm conseguido explorar o potencial de cultivares como as desenvolvidas pela Embrapa, obtendo produtividades médias superiores a 100 sc/ha. Esse foi o cenário de fundo do Dia de Campo Trigo Irrigado, realizado no dia 18 de setembro pela Cooperativa Agropecuária da Região do Distrito Federal (COOPA-DF) e pela Embrapa na propriedade de Jolmir Cenci, no PAD-DF, Distrito Federal. O evento reuniu 250 pessoas, entre produtores da região e técnicos.
Responsável técnico da COOPA-DF, Claudio Malinski disse que a cooperativa precisa incentivar o cultivo do trigo na região não apenas para obter matéria-prima de qualidade para o moinho, mas também para que o produtor rural tenha os benefícios que a cultura traz indiretamente às demais culturas que a sucedem. “Devemos produzir cerca de 400 mil sacos (de farinha) e estamos pagando R$ 982 pela tonelada do BRS 254 e R$ 910 pela tonelada do BRS 264”, destacou. Cerca de 40 cooperados, representando uma área plantada próxima de 8 mil ha, fornecem trigo à COOPA-DF. A produção esperada nesta safra para o trigo irrigado deve ficar em torno de 750 mil sc, com produtividade média de 93,75 sc/ha. 
A cultivar BRS 254 é o carro-chefe em trigo da cooperativa. “Estamos favorecendo a cultivar por ser o trigo mais interessante para o moinho. Qualquer outro produzido no Brasil, ao ser misturado com o BRS 254, vai produzir uma farinha de qualidade para a indústria. Os demais materiais são bons, mas é preciso mais cuidados na escolha para fazer o blend por haver alguns fatores limitantes”, explicou Malinski. Ele lembrou que a BRS 254 também requer atenção quanto ao risco de acamamento (queda ou arqueamento das plantas). “Mas ele tem uma vantagem. O ciclo é mais longo e, se pegar frio, é possível aumentar a produção para 8 ton/ha (ou 133 sc/ha)”.
Para atualizar e tirar dúvidas dos participantes do Dia de Campo, os pesquisadores da Embrapa apresentaram informações sobre as cultivares desenvolvidas pela pesquisa da Empresa adaptadas ao Cerrado do Brasil Central e disponibilizadas ao mercado. Também abordaram o manejo da cultura do trigo e das doenças que acometem as lavouras.  
Cultivares da Embrapa 
Lançada em 2015, a cultivar de trigo irrigado BRS 394 também pode ser indicada para o sistema de sequeiro (trigo safrinha). Alia alta produtividade (acima de 120 sc/ha em sistema irrigado e de 60 sc/ha na safrinha) e maior tolerância ao acamamento em relação, por exemplo, à BRS 254. É um material precoce, com ampla adaptação de época de plantio, sendo colhido em 110 a 115 dias. A espiga laxa (dilatada), com maior espaçamento entre as espiguetas, facilita o controle preventivo da brusone, principal doença que acomete os trigais da região tropical brasileira. Em solos bem manejados, as raízes podem alcançar dois metros de profundidade, como constatado em lavouras comerciais.
omparou Albrecht.
Ele lembrou ainda que a BRS 264 é bastante responsiva à densidade de plantio. A recomendação é utilizar 200 kg/ha de sementes para alcançar o potencial produtivo da cultivar – menos que isso resultará em produtividades inferiores. “Vale a pena gastar um pouco mais com sementes e obter 20 a 30 sc/ha a mais que outras cultivares, pois ela responde bem à densidade de semeadura”, apontou.
Já a BRS 254, também lançada em 2005, pode ser plantada um pouco mais tardiamente (em função de uma terceira cultura, por exemplo), apesar da melhor época de plantio também ser a primeira quinzena de maio. Além disso, tolera melhor chuvas durante a colheita se comparada à BRS 264, por ter um grão mais fechado e duro. Tem ciclo precoce/médio e potencial produtivo de 100 sc/ha (há produtores ultrapassando os 120 sc/ha), sendo resistente à debulha e moderadamente resistente ao acamamento, demandando maior atenção na quantidade de nitrogênio em cobertura e no momento da aplicação do regulador de crescimento.
Considerado um trigo padrão pela COOPA-DF, tem força de glúten média de 330 x 10-4 J, alcançando 400 x 10-4 J, e estabilidade de 25 a 32 minutos, sendo classificado como trigo melhorador. “Como ele é muito forte, é usado para melhorar trigos de baixa força de glúten e de baixa estabilidade na produção de farinha para panificação. Por isso é tão importante para os moinhos”, explicou.
Por fim, a cultivar de trigo sequeiro BRS 404, lançada em 2015, é tolerante à seca e ao calor e indicada para o sistema de sequeiro (safrinha), com o plantio mais indicado para o mês de março. O potencial produtivo médio é de 60 sc/ha em sequeiro (com produtores já tendo alcançado 80 sc/ha) e pouco mais de 100 sc/ha em sistema irrigado, para o qual também pode ser indicado, pois, segundo Albrecht, é bem responsivo com pouca água. É uma cultivar de ciclo precoce, resistente à debulha e moderadamente resistente ao acamamento. Classificada como trigo pão, a variedade tem alta força de glúten (320 x 10-4 J) e estabilidade acima de 12 minutos, garantindo boa liquidez na venda aos moinhos.
Recomendações de manejo
Segundo o pesquisador Jorge Chagas, da Embrapa Trigo (Passo Fundo, RS), a diversidade de sistemas irrigados na região dificulta a geração de orientações de manejo que se encaixem perfeitamente em todos os casos. “Fazemos um apanhado das situações encontradas e geramos uma recomendação de manejo básico para que o produtor não cometa erros que levem à perda de produtividade e tenha sucesso na condução da lavoura”, explicou. Ele apresentou as recomendações para os componentes mais importantes do manejo das cultivares de trigo da Embrapa a partir de resultados de ensaios em áreas de produtores do DF, de Cristalina (GO) e de Unaí (MG).
O primeiro fator a ser observado é a semeadura, que pode ser a lanço ou em linha, com o uso de semeadora. A segunda opção é a mais recomendável por ter diversas vantagens, como profundidade do plantio mais adequada, economia de sementes, maior eficiência no uso de fertilizantes, conservação do plantio direto, possibilidade de uso de herbicidas pré-emergentes e, principalmente, maior uniformidade do arranjo de plantas. “Boa parte das sementes a lanço ficam pouco profundas. Na época do enchimento de grãos, pode haver perdas por acamamento, porque a planta estará pouco ancorada ao solo”, observou Chagas.
A época de semeadura recomendada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a partir de estudos de zoneamento agrícola de risco climático para o trigo irrigado na região, é de 11 de abril a 31 de maio. No entanto, as pesquisas têm levado à indicação da janela de 5 a 20 de maio, datas menos favoráveis à brusone. Caso o produtor decida semear após o dia 20 de maio, deve utilizar as cultivares BRS 394 ou BRS 254, mais tolerantes a eventuais chuvas durante a colheita, em setembro.
Ao mostrar que uma mesma cultivar pode ter diferentes curvas de resposta à mesma densidade de semeadura em diferentes fazendas, Chagas ressaltou que a pesquisa busca gerar recomendações de densidade médias de semeadura para o melhor desempenho do potencial das cultivares. Dessa forma, a recomendação é de 300 a 350 sementes viáveis/m² para a BRS 254, com 51 a 60 plantas/m linear; de 340 a 390 sementes viáveis/m² para a BRS 394, com 58 a 66 plantas/m linear; e de 400 a 450 sementes viáveis/m² para a BRS 264, com 68 a 76 plantas/m linear no espaçamento de 17 cm entrelinhas.
O pesquisador atentou para a verificação do Peso de Mil Sementes (PMS), em gramas. “Temos encontrado grande variação nos lotes de sementes da mesma cultivar. Se você planta com uma recomendação genérica de 200 kg/ha de sementes, por exemplo, e o PMS é de 35g, estará usando 20% a mais de sementes que o recomendado. Com isso, resultará em quase 500 plantas por m², com uma maior tendência ao acamamento”, explicou.
Se a lavoura já tiver sido plantada com densidade de semeadura acima da recomendada para a cultivar, a recomendação é baixar a dose de nitrogênio. E em caso de erro na aplicação do regulador de crescimento no final do ciclo, é necessário ajustar o manejo da irrigação para evitar o acamamento antes do enchimento dos grãos. “O acamamento talvez seja o principal problema do trigo irrigado (da região) depois da brusone. Temos que manejar a lavoura de forma que ela não acame ou acame somente no final”, disse Chagas.
Outro fator chave é a adubação, já que a cultura demanda um solo equilibrado. É importante verificar o histórico da área, a saturação de bases recomendada e se o alumínio está neutralizado. Para a adubação de plantio, deve-se observar as doses recomendadas de fósforo (80 a 100 kg/ha); de potássio (40 a 60 kg/ha); de boro, para evitar a esterilidade das espiguetas; de zinco, principalmente em plantios após o milho; além de cálcio e enxofre, que podem ser fornecidos pelo calcário e pelo gesso agrícola.
A aplicação de nitrogênio recomendada é de 20 a 40 kg/ha na base e o restante em cobertura, do plantio até 15 dias após a germinação. No cultivo após milho, deve-se aumentar o nitrogênio em cerca de 15%. A aplicação tardia do nitrogênio, visando ao aumento da qualidade, não deve ser feita. “Nossas cultivares já têm a qualidade para panificação, mesmo com zero de aplicação de nitrogênio”, apontou. Segundo o pesquisador, quanto maior a densidade de semeadura e nitrogênio, maior a chance de acamamento, por isso o produtor deve estar atento a essa relação entre esses fatores e o regulador de crescimento. “Cercar esse tripé culmina na alta produtividade. Mas se você começa com a densidade errada, com excesso de nitrogênio e ainda erra o timing de aplicação do regulador de crescimento, a chance de ter uma lavoura “acamada” e com perdas de produtividade é muito grande”, ensinou.
De acordo com os estudos nas fazendas, as melhores respostas ao nitrogênio aplicado em cobertura (com 20 kg na base) foram nas doses totais (cobertura mais base) de 100 a 120 kg/ha na BRS 254, de 120 a 140 kg/ha na BRS 264 e de 110 a 130 kg/ha na BRS 394. “Aplicando mais nitrogênio que isso, a planta fica susceptível ao acamamento. É importante respeitar essas respostas”, justificou Chagas.
Quanto ao regulador de crescimento, a recomendação é aplicar de 0,5 L/ha no primeiro nó visível ou duas aplicações de 0,3 L/ha – uma no primeiro nó visível e outra, seis dias depois, no segundo nó visível. “Muitos produtores têm adotado a aplicação dividida em duas doses de 0,3L/ha porque é mais fácil acertar o ponto do primeiro nó visível”, comentou. A aplicação deve ocorrer nas horas de temperaturas mais amenas do dia e com pouco vento, evitando-se o repasse da barra pulverizadora. O produto não deve ser aplicado em plantas sob estresse, principalmente por herbicidas, devendo-se aguardar cinco dias. Também não deve haver aplicações de outros produtos até cinco dias após a aplicação do regulador de crescimento A irrigação só deve ser realizada novamente de dois a três dias após a aplicação do regulador, para evitar a lavagem do produto e garantir a eficiência.
O manejo da irrigação pode ser feito com auxílio da página Monitoramento de Irrigação no Cerrado. Basta selecionar “Culturas Anuais” e depois “Embrapa 42” para BRS 394 e BRS 264 ou “Embrapa 22” para BRS 254. A página mostra o passo a passo do manejo da irrigação, a partir da data de emergência da cultura informada, calculando a evapotranspiração do dia a partir de dados colhidos de uma rede de estações climatológicas e fornecendo a lâmina de água a ser aplicada e o turno de rega.
Chagas também comentou sobre a cultivar BRS 404, salientando que o trigo sequeiro não compete com o milho safrinha no sistema, já que é plantado em uma janela diferente – de 5 a 20 de março. A BRS 404 tem baixo custo, requerendo menos sementes (250 a 300 sementes viáveis/m², o equivalente a 130 a 140 kg/ha) e, quando plantada após a soja, necessita de no máximo 30 kg/ha de nitrogênio em cobertura. Por outro lado, apresenta o risco de perdas com brusone em caso de chuvas. “Temos que buscar a época seca e ficar atentos à previsão do tempo, pois ainda não existem cultivares resistentes à brusone”, completou.
Manejo integrado de doenças
Um dos principais itens do manejo integrado de doenças no trigo e nas demais culturas agrícolas é a rotação de culturas. O pesquisador Angelo Sussel, da Embrapa Cerrados, explicou que a formação de palhada do trigo tem efeitos positivos e negativos. “A palha impede que as plantas daninhas venham na cultura seguinte, deixando a área limpa após a colheita do trigo. Mas ela também contém o inóculo de todas as doenças que ocorreram na área naquele ano. Apenas com a colocação de outras culturas em seguida, conseguimos que essa palha apodreça e não esteja mais presente no próximo ciclo de cultivo do trigo. Essa é a importância da rotação de culturas”, destacou, acrescentando que a ausência da palha reduz a infecção por manchas no cultivo seguinte de trigo.
Além da rotação de culturas, o produtor deve observar se a cultivar a ser semeada é resistente a doenças e se foi validada na região e em ano favorável à ocorrência dessas enfermidades. “A resistência na cultivar é a tecnologia mais barata para o manejo de doenças. Não vale a pena trabalhar com uma cultivar que não é resistente num ambiente altamente favorável à ocorrência de doenças, principalmente no caso do trigo de sequeiro, que tem maior pressão de doenças”, explicou. 
As sementes devem estar sadias, o que pode ser verificado pela análise fitossanitária realizada por laboratórios. O nível de infecção das sementes vai indicar se elas podem ser utilizadas no plantio, se será necessário o tratamento com fungicidas para a redução do inóculo (caso o nível de infestação seja baixo) ou se terão que ser descartadas e vendidas como grãos. O pesquisador ressaltou a importância do tratamento de sementes para reduzir a presença do inóculo, mas que a medida só terá efeito se a área estiver limpa. “Não adianta ter uma semente tratada se a área ainda tem palhada e no ano interior houve a incidência de manchas e de brusone, onde o inóculo já está presente”.
A eliminação manual de plantas com inóculo (“carvão”), segundo Sussel, é extremamente necessária, pois os esporos dos fungos causadores de doenças se espalham facilmente com o vento, atingindo outras espigas e infectando as sementes. Já a época de plantio deve ser observada principalmente para o manejo da brusone. O plantio antes das datas recomendadas aumenta o risco de infecção devido a maiores quantidades de chuvas e de orvalho. “Chuva e orvalho ocasionam a presença de água na superfície de folhas e espigas. E a água é o agente facilitador de qualquer infecção”, afirmou Sussel.
A nutrição equilibrada e o manejo da irrigação são fatores que proporcionam economia de adubo, de água e de energia. O pesquisador recomendou a análise periódica de solo da área para a reposição exata dos nutrientes necessários às plantas. “Na planta mal nutrida, os genes de resistência terão menor resposta. Na planta bem nutrida, esses genes responderão melhor, ela será mais resistente e vai explorar o máximo de potencial”, comentou. 
Quanto à irrigação, deve-se colocar apenas a quantidade recomendada de água para a cultura. “Se você puder fazer uma lâmina maior (de água) no período do emborrachamento****, antes da emissão das espigas e, após esse período, deixar o máximo de tempo sem irrigação, resultando em menos dias molhados, reduzirá a chance de brusone na área”, sugeriu, não excluindo a necessidade de pulverizações preventivas de fungicida.
O monitoramento de doenças deve ocorrer desde o plantio, mas deve ser intensificado a partir do primeiro nó visível, quando haverá a exposição das quatro folhas que garantem a máxima produtividade da planta – a folha bandeira e as três abaixo dela. Para protegê-las durante todo o ciclo, deve-se observar as condições climáticas (chuva, temperatura e orvalho), e se já existe a ocorrência de manchas na área. Sussel salientou que o uso de fungicidas é o último recurso a ser usado.
As principais doenças da cultura no trigo na região, além da brusone, são o oídio, as manchas foliares e as ferrugens. “Oídio e ferrugens são controlados principalmente com cultivares resistentes, que garantirão a redução da aplicação de fungicidas. Para as manchas foliares, a rotação de culturas é importantíssima para reduzir a ocorrência, além do tratamento de sementes”, explicou.
Quanto à brusone, a pulverização de fungicidas deve ser iniciada no período de emborrachamento e espigamento, momento em que a folha bandeira fica exposta. “Se a pulverização for feita, a folha bandeira e as folhas de baixo serão protegidas, além de haver redução do inóculo para a semana seguinte, em que as espigas estão sendo emitidas. Ao reduzir o inóculo e a irrigação nesse período, a possibilidade de ocorrência de brusone será menor”, disse. Outra medida é monitorar a lavoura e as áreas vizinhas, além de verificar se a condição climática é favorável à doença.
O manejo da brusone, segundo o pesquisador, é sempre preventivo. “O fungicida aplicado protege, mas não cura. Se a espiga já foi infectada, vai morrer. Não existe recuperação do tecido que já foi infectado”, afirmou. Outro ponto importante é a tecnologia de aplicação, em que devem ser observados a rotação dos grupos químicos dos fungicidas (e não somente das moléculas), o que contribui para a manutenção da eficácia dos princípios ativos; o volume de calda recomendado; as pontas do pulverizador, que devem tem dois ângulos de ataque; a dose recomendada de adjuvantes para o fungicida; e o horário da aplicação, evitando-se os períodos do dia com umidade relativa do ar mais baixa e temperaturas mais altas.
O pesquisador lembrou que as médias de chuvas em março e abril de 2019 ficaram acima da média histórica, com mais dias chuvosos, e que as perdas nas lavouras de trigo safrinha foram significativas. “Quem monitorou as doenças do trigo e fez pulverizações logo no início, conseguiu colher trigo sequeiro. Quem não fez o monitoramento, não conseguiu controlar as doenças”, disse. 
À época, alguns produtores suspeitavam que uma nova bactéria estaria prejudicando os trigais. Sussel lembrou que a Embrapa promoveu uma força-tarefa, na qual pesquisadores coletaram amostras em diversas fazendas da região. “Não havia nova bactéria. O que alguns viram foi uma bactéria coadjuvante, que estava ali simplesmente por ser oportunista. O problema era mancha foliar e brusone na folha. O trigo plantado mais cedo acabou morrendo provavelmente por excesso de água e de doenças, além de manejo inadequado”, concluiu, alertando novamente para a verificação da adaptação das cultivares para plantio na região do produtor.
Produtores ressaltam vantagens
Produtor em Cristalina (GO) Helcio Wander plantou 190 ha de trigo irrigado nesta safra. O pivô de 130 ha com a cultivar BRS 264 obteve média de 125 sc/ha. A colheita dos 60 hectares com BRS 254 havia se iniciado na véspera do Dia de Campo, e a expectativa era de produtividade acima dos 100 sc/ha. 
Ele observou um desempenho das lavouras bem melhor que nos anos anteriores. “O clima ajudou bastante, com dias frios durante o ciclo”, disse. Na propriedade, o trigo é utilizado na rotação de culturas – neste verão, dará lugar à soja no pivô onde a cultivar BRS 264 foi colhida. No próximo ano, deve ser sucedido pelo milho e, no ano seguinte, por hortifrutícolas. “Fazemos essa rotação para minimizar ao máximo as doenças de solo, como nematoides”, explicou.
Quanto à brusone, Wander conta que no princípio ficou apreensivo por causa do acometimento das lavouras de trigo sequeiro no primeiro semestre deste ano. “Depois que plantamos o trigo nos pivôs, achamos que daria muito problema. A sorte é que esfriou bastante. Aplicamos produtos e conseguimos passar (pela brusone)”.
Rodrigo Werlang, produtor no PAD-DF, utiliza o trigo no sistema de produção desde 1988, tendo plantado diferentes cultivares da Embrapa. Neste ano, ele optou por plantar trigo safrinha BRS 404 para produção de sementes para a COOPA-DF em uma área de 45 ha com irrigação. Foi utilizado um pivô que tem restrição de água, daí a escolha de uma cultivar de sequeiro, que requer menos água. “Seguimos uma planilha de irrigação no DF na qual o pivô irriga por dois dias e fica um dia parado. Então, ele encaixou certinho para esse material”. 
O plantio foi atrasado em alguns dias devido a questões operacionais da fazenda, o que acabou ajudando a lavoura a escapar da brusone. “Fechamos uma média de 93 sc/ha desse trigo safrinha no pivô, com peso do hectolitro de 84 kg/hl. É um material que nunca tínhamos plantado. Requer um cuidado devido ao risco de acamamento, que cresce muito, e é preciso acertar o ponto certo do redutor de crescimento”, comentou. 
No sistema de Werlang, após a soja no verão, é plantado milho, trigo ou feijão de forma escalonada nos pivôs em que não será cultivado o milho safrinha. Para o ano que vem, o produtor ainda está analisando o que fará. “Quando definirmos a safrinha, veremos o que vai entrar nos pivôs, se feijão ou trigo. Uma coisa que nos limita muito é a questão da água. Se for um ano que não chove muito, vamos plantar o feijão, que tem o consumo de água um pouco menor”, explicou. 
O produtor aponta a formação da palhada como principal vantagem do trigo no sistema. “Como temos problema de ter pouca palha para o plantio direto, ela permite um plantio fantástico. E por mais que seja uma área de pivô, em janeiro, num veranico, a irrigação é mais difícil porque a evapotranspiração é muito alta. Notamos que a palhada segura mais (a umidade). Isso vai impactar a produtividade lá na frente”, analisou.
William Matté, é produtor no PAD-DF e em Cristalina. Ele plantou 55 ha de trigo sob pivô, metade da área com BRS 254 e a outra metade com BRS 264. A ideia foi comparar o desempenho dos materiais. O produtor havia plantado a BRS 254 em 2018 e, neste ano, quis conhecer a BRS 264. 
“É uma cultura para participar da rotação de culturas do nosso sistema de produção irrigada. Tem um sistema radicular diferente, com raízes bem interessantes para o Sistema Plantio Direto, além de bastante palha, formando matéria seca”, disse. Após o trigo, será plantada soja no verão, como no ano passado. A ideia é aumentar a área irrigada para o próximo ano, mantendo 20% com trigo para a rotação de culturas. “A palhada tem uma relação carbono-nitrogênio muito boa, decomposição um pouco mais lenta, sendo mais duradoura no sistema”, apontou Matté.
Já Paulo Bonato plantou trigo em 102 hectares sob pivô na propriedade em Cristalina, sendo metade da área com BRS 254 e metade com BRS 264. Nesta safra, as produtividades foram de 126 sc/ha com a BRS 254 e 128 sc/ha com a BRS 264, chegando a 143 sc/ha com esta última em algumas áreas da lavoura. “A expectativa era de produtividades até maiores em função de como estava a lavoura no campo. Mas a qualidade do trigo está muito boa, o peso do hectolitro em torno de 85 kg/hl, valor difícil de conseguir. Estou satisfeito”, afirmou o produtor.
Para Bonato, o trigo se encaixa perfeitamente no sistema de rotação de culturas em sistema irrigado da fazenda, que envolve soja, feijão, milho semente. “Faço a rotação no pivô e entre os pivôs, para não ter resto de cultura na próxima vez em que for plantar. A palha do trigo é persistente, demora a se decompor. Se plantar trigo este ano num pivô, só vou plantá-lo de novo daqui a dois anos nesse pivô”, explicou. 
Segundo o produtor, as vantagens de uso do trigo são principalmente o sistema radicular aprofundado, a palhada de qualidade e a diversificação de fonte de renda. “Isso dá estabilidade financeira, um fluxo de caixa. A cooperativa define o preço junto com os produtores. Ela necessita da matéria-prima e pode remunerá-los melhor por não precisar pagar um frete lá do Paraná ou da Argentina”, comentou, também elogiando a adaptabilidade e a produtividade das variedades desenvolvidas pela Embrapa.
Apesar de ter realizado o plantio no período recomendado, ele teve que realizar mais pulverizações de fungicidas que em outros anos devido à grande pressão de brusone observada nas lavouras de trigo safrinha da região no primeiro semestre. “Para a brusone o controle é preventivo. Você não está vendo, mas se deixá-la aparecer, acabou, ela já causou o prejuízo no local da infecção”, lembrou.
Bonato, que sempre foi triticultor, observou que a cada ano há situações climáticas que interferem no desenvolvimento da cultura. “Se eu soubesse que este ano seria mais quente na fase inicial da lavoura, teria aumentado a quantidade de plantas por m², o que aumentaria o nível produção. Num período mais quente, o trigo não perfilha tanto. Mas se você trabalha com um número de plantas maior, no período mais frio tem o acamamento. Então, é muito difícil equalizar”, disse. “Você tem que acompanhar diariamente a cultura, observando o que pode ser melhorado para o ano seguinte”, acrescentou.
Fonte: Embrapa Cerrados

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