Se as condições de clima se mantiverem favoráveis, o Brasil deve colher 2,86 milhões de toneladas de algodão (pluma) na safra 2019/2020, mantendo a expectativa dos produtores em janeiro. O total que segue para a indústria internacional deve ser de 1,95 milhões de toneladas até julho, uma redução em relação aos 2,05 milhões de toneladas previstos, mas, ainda assim, um recorde histórico. Neste período, a área plantada nos 10 estados produtores totalizou 1,6 milhões de hectares. Os números foram apresentados nesta quarta-feira (29/04), durante a 58ª Reunião da Câmara Setorial do Algodão e Derivados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a segunda do ano, realizada, pela primeira vez, via internet.
A Câmara reúne representantes dos diversos elos da cadeia produtiva da fibra e os debates hoje giraram em torno dos impactos da Covid-19 na produção, indústria, comércio e logística. “Temos à frente desafios do tamanho de uma safra de quase três milhões de toneladas, mas os maiores serão para a próxima. Não há ainda uma estimativa clara sobre retração de área, mas é certo que vai acontecer, com a perspectiva de redução mundial da demanda por algodão, os baixos preços do petróleo, que favorecem as fibras sintéticas, e o comércio no mercado interno, praticamente, parado nesses últimos meses”, contextualiza Milton Garbugio, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) e também da Câmara.
De acordo com Garbugio, a Abrapa está argumentando com o Governo Federal o aprimoramento de mecanismos para minimizar os impactos da pandemia na cadeia produtiva. Dentre eles, o reajuste do preço mínimo. A Associação defende um valor de R$ 91,97 pela arroba de algodão, contra os atuais R$ 72/arroba. O índice é a referência para os programas governamentais de crédito e de suporte à comercialização. Mesmo com o reajuste, o preço mínimo ainda estaria abaixo do valor de mercado. Além disso, o cálculo é feito com base em uma média nacional de custos, que o torna ainda mais distante da necessidade de estados onde é mais caro produzir algodão, como a Bahia.
Indústria
Se a produção nesta safra mantém os planos inalterados, a indústria têxtil e de confecção amarga prejuízos em cascata, e o setor também negocia medidas efetivas com o Governo Federal e de estados como São Paulo. Lockdowns, desemprego e incertezas derrubaram o consumo, e a retomada deve ser lenta. “As empresas não conseguem cumprir os compromissos, começando pelos varejistas, que tiveram suas lojas fechadas, passando para o confeccionista, chegando à indústria têxtil, e, em breve, aos fornecedores”, explica o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções (Abit), Fernando Pimentel. Segundo ele, sem capital de giro, esses elos não aguentam muito mais tempo.
A retomada, para a Abit, começará a partir de junho. “Se tudo der certo, vamos iniciar a operação de uma maneira ‘mais arrumada’, com 30% a 50% dos negócios, e, lentamente, evoluir até chegar a, no máximo, 75%, no final do ano”, disse. Às vésperas do Dia das Mães, a segunda maior data do varejo, a Abit espera em torno de 30% a 40% de movimentação sobre a expectativa prévia. “Mesmo onde já há lojas abertas, como em Santa Catarina, ou para quem tem e-commerces mais bem desenvolvidos, o movimento ainda está menor que 50% do normal”, revela.
Máscaras
A conversão de parte da produção de roupas para as máscaras de proteção social, majoritariamente, feitas de fibras naturais, segundo Pimentel, não consegue compensar as perdas nem impulsionar o consumo de algodão. “Se cada brasileiro comprasse quatro máscaras, teríamos cerca de 1 bilhão de unidades, e uso de 60 a 70 milhões de metros de tecido. O setor, que fatura R$15 bilhões por mês, se vivesse de fazer máscara, faturaria de R$3 bilhões a R$ 4 bilhões por ano”, compara. “Estamos trabalhando por uma retomada de consumo organizada, protocolada e segura, para uma normalidade que ainda não sabemos qual será”, diz Pimentel. Ele afirma que o câmbio ajuda a indústria nacional de vestuário, mas não descarta uma investida da China em produtos com preços muito abaixo dos nacionais no mercado.
Embarques
O presidente da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), Henrique Snitcovski, falou sobre a revisão na meta para 2020 e o alongamento dos embarques, que acarretará maior estoque de passagem em 2021. Os destinos principais do algodão brasileiro representam 80% das exportações. Eles são China (32%), Vietnam (15%), Bangladesh (12%), Paquistão (11%), Indonésia (10%) e Turquia (9%). “O Brasil está crescendo em todos esses destinos. Para a China, o volume embarcado nessa safra vai ser recorde. Mas ainda temos espaço para crescer bastante dentro das importações desses países”, disse.
A projeção da Anea para o segundo semestre de 2020, safra 2019/2020, é de exportar 1,05 milhões toneladas de algodão em pluma, pouco abaixo do segundo semestre do ano passado, que ficou em 1,08 milhões toneladas. “Já vimos que, com bom planejamento, conseguimos recordes como o de mais de 300 mil toneladas em um único mês. Isso dá credibilidade para o país. O Brasil está competitivo e esperamos que, à medida em que os problemas sejam contornados e as atividades voltem ao normal, possamos aumentar participação nos principais mercados consumidores”, concluiu Snitcovski.
Insumos
O fornecimento de insumos, como defensivos químicos e fertilizantes, também estava representado na reunião. Para Marcio Trento, da CropLife Brasil, essa cadeia pode sofrer algumas restrições no suprimento, principalmente, na Índia, onde o lockdown é mais severo. Junto com a China, esses dois países são a origem da maior parte dos princípios ativos. “A indústria vem tentando minimizar qualquer tipo de impacto, antecipando algumas importações, para que tenhamos os nossos produtos disponíveis para garantir a produção nacional. Estamos recomendando o mesmo aos nossos clientes. A ideia é evitar possíveis gargalos”, falou.
De acordo com o executivo da Associação Nacional para a Difusão de Adubos (Anda), considerando-se todo o fluxo logístico da cadeia de fertilizantes, até o momento, as operações estão normais, “embora com pequenas particularidades nas fábricas, como o novo padrão de distanciamento entre funcionários, por exemplo”, afirmou.
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