quinta-feira, 27 de novembro de 2014
Área de reforma agrária foi usada por quadrilha de latifundiários, diz MPF
Assentamento em cidade de MT foi usado para monoculturas, acusa MPF.
Operação 'Terra Prometida' tem alvo em quadrilha de grandes fazendeiros.
27/11/2014 18h41 - Atualizado em 27/11/2014 19h08
Renê Dióz
Do G1 MT
A quadrilha investigada em Mato Grosso pela Polícia Federal (PF) na operação "Terra Prometida", deflagrada nesta quinta-feira (27), tem como líderes pelo menos 13 fazendeiros e empresários suspeitos de explorar terras destinadas à reforma agrária na região de Itanhangá (cidade a 447 km de Cuiabá) para monoculturas, como de soja e de milho. A acusação é do Ministério Público Federal (MPF), que solicitou à Justiça a expedição de 52 mandados de prisão contra a quadrilha investigada.
A operação Terra Prometida combate crimes de corrupção, fraudes, invasão de terras públicas e crimes ambientais. Dois irmãos do ministro da Agricultura, Neri Geller, figuram entre os investigados e os que tiveram mandados de prisão expedidos contra si. Ao todo, a Justiça Federal expediu 52 mandados judiciais de prisão, 146 mandados de busca e apreensão e 29 de medidas proibitivas.
Além de Cuiabá e outras nove cidades de Mato Grosso, os mandados foram expedidos para cumprimento em cidades nos estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. Até o fim da tarde desta quinta-feira, a PF tinha conseguido cumprir 30 mandados de prisão.
Os irmãos de Geller devem se apresentar espontaneamente, segundo anunciou o superintendente da PF em Mato Grosso, Marcos Antônio Farias. O Ministério da Agricultura divulgou nota esclarecendo que o ministro (o qual estava retornando de missão nos Emirados Árabes nesta tarde) não é investigado na operação e sequer possui vínculo com jurídico ou sociedade com qualquer um dos envolvidos. Ele ainda lamentou o envolvimento de seus irmãos na investigação, mas se disse convicto de que eles não se envolveram com qualquer irregularidade.
Latifundiários
Conforme a denúncia apresentada pelo MPF à Justiça Federal, a quadrilha investigada se divide em pelo menos quatro núcleos, com atividades bem específicas, e o primeiro núcleo seria formado justamente por fazendeiros e empresários. Conforme as investigações, eles estariam subdivididos entre “liderança” (com 14 pessoas) e “segundo escalão” (com 62 pessoas).
O segundo núcleo seria formado por quatro sindicalistas (um deles também atuaria como integrante do primeiro núcleo). O terceiro núcleo seria de quatro servidores públicos. Já o quarto núcleo da organização criminosa consistiria em apenas uma pessoa, considerada “colaboradora”.
As investigações tiveram início em 2010, mas como o projeto de assentamento (PA) na região de Itanhangá foi instituído em 1997, o MPF e a PF não descartam que o esquema de exploração ilegal das terras (e outros crimes) tenham ocorrido desde aquele ano. Conforme as investigações, a ação da quadrilha “desfigurou completamente” o assentamento.
“A Polícia Federal constatou que atualmente já não são comuns no PA Itanhangá lotes ocupados por pessoas com perfil de beneficiários de projetos de reforma agrária - trabalhadores rurais explorando a terra em regime de economia familiar ou individual com a produção de variadas espécies vegetais e a criação de animais para o consumo da própria família, com a comercialização de eventual excedente”, apontou o MPF à Justiça ao requerer os mandados judiciais de prisão e de busca e apreensão cumpridos na operação Terra Prometida.
“Ao invés disso, o que se teria por lá são fazendas de grandes extensões dedicadas à monocultura da soja e/ou do milho (este geralmente cultivado na entressafra daquela) formadas pela concentração de lotes, muitas vezes dezenas deles, nas mãos de alguns poucos produtores de soja, muitos deles ricos e poderosos, que os obtiveram mediante a compra voluntária ou forçada, quando não pela simples expulsão dos assentados, tudo com a conivência e participação do sindicato rural local, políticos, autoridades locais e servidores do Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária]”, acrescentou o MPF.
Atuação da quadrilha
O MPF sintetizou a forma com que a quadrilha atuava e apontou que os crimes começavam na figura dos fazendeiros e empresários líderes do esquema.
Segundo a acusação, os fazendeiros e empresários quando se interessavam por lotes do projeto de assentamento procuravam os beneficiários da reforma agrária para negociar com eles a desistência de suas áreas, pressionando-os com propostas de compra por valores abaixo dos praticados no mercado. A argumentação utilizada para pressionar os assentados era de que se tratava de um negócio de alto risco.
Caso os assentados não aceitassem a transação, eram ameaçados de morte ou de expulsão do local. Para isso, a quadrilha contaria com colaboradores como pistoleiros, denunciou o MPF.
Em seguida, termos de desistência das áreas eram fraudados (inclusive com assinaturas falsas dos assentados) e remetidos ao Incra. Já no caso de êxito por meio da pressão aos assentados, os líderes da quadrilha os faziam assinar os termos.
Depois a quadrilha providenciava nomes de pessoas (“laranjas”) - entre elas, parentes - para serem indicados pelo Sindicato Rural ao Incra como novos assentados das áreas. Para homologar essa troca, o esquema contava com auxílio de servidores públicos do Incra, os quais simulavam vistorias nos lotes apontando que estes já se encontravam ocupados pelos “laranjas” havia muito tempo, justificando os termos de desistência.
Logo, o Incra emitia cartas de ocupação, declarações de posse e homologação em favor do novo posseiro, enquanto as terras, na realidade, estariam sendo ocupadas pelos latifundiários líderes do esquema.
tópicos:
Cuiabá, Itanhangá, Ministério Público Federal, Polícia Federal
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